Caminho Central Português

30 de Julho de 2013, 1.ª jornada. Coimbra - São João da Madeira - 110 km.

Coimbra, junto à igreja de São Tiago
O momento tão ansiado tinha finalmente chegado, mais uma vez não consegui descansar o tempo que se impunha. Às 06:00 reunimo-nos na garagem do José Botelho para rumar junto à igreja de São Tiago, em Coimbra, onde iniciámos o Caminho Português de Santiago de Compostela.

Após o pequeno ritual das fotos, iniciámos o Caminho, pela margem direita do Mondego. As primeiras pedaladas, pela manhã, eram leves e quase faziam esquecer o peso dos alforges.

Na Mealhada uma primeira paragem para o indispensável café. Foi também o momento do encontro dos primeiros peregrinos, um jovem casal procedente da Lituânia, com quem trocámos algumas palavras.
Peregrinos procedentes da Lituânia
O momento era de progredir no caminho, mas o certo é que fomos andando um pouco aos solavancos, com paragens em Anadia, Avelãs de Caminho, Águeda, cidade onde aproveitámos para obter um conjunto de fotos original.

Uma das ruas da baixa de Águeda apresentava-se quase totalmente coberta por guarda chuvas coloridos, formando um efeito engraçado e produzindo agradável sombra para dias de calor, como era o caso.


Continuámos o caminho. À medida que a manhã avançava, o calor sentia-se, cada vez mais forte. Depois de passar Águeda, foi altura para cuidar de reabastecer os depósitos de combustível das bicicletas, assim parámos num café em Mourisca do Vouga e tratámos de refrescar as gargantas e da desejada alimentação.

Ponte do Marnel

Em Pedaçães descemos à Ponte Medieval do Marnel, situada a 100m da antiga Estrada Nacional n.º 1 que permitia a travessia de Cabeço do Vouga. A ponte integrava o extenso traçado da antiga via romana que ligava Bracara Augusta a Olisipo.

Prosseguimos o caminho com uma paragem forçada na travessia do Vouga, pois a velha ponte por onde haveríamos de passar estava subtraída de um tabuleiro, o que nos obrigou a pedalar um pouco pela IC2, para entrar de novo no caminho.

Após a passagem das "Albergarias", Velha e Nova, um pouco antes de chegar ao extinto concelho de Pinheiro da Bemposta, localidade da qual desconhecia o seu rico património histórico e arquitectónico, ainda conversámos com um peregrino italiano que se lamentava do percurso do Caminho Português, entre Lisboa e Golegã e de Coimbra para Norte, com poucas sombras e muito asfalto. Concordo, é um martírio para quem viaja, sobretudo a pé.

Pinheiro da Bemposta
Em Oliveira de Azeméis impôs-se nova paragem para um pequeno lanche e reabastecimento de água, a sua ingestão frequente é absolutamente fundamental para não se cair em desidratação.

A jornada aproximava-se do seu termo, em Cucujães, após passarmos por uma pequena ponte medieval, efectuámos uma repentina visita ao exterior do Mosteiro. Finalmente, após alguns quilómetros a subir, chegámos ao centro de São João da Madeira, pelas 19:40, tendo percorrido 110km. Aqui foi necessário esperar cerca de 40m, junto às instalações da Associação de Bombeiros Voluntários, por um membro da companhia de bombeiros que nos indicou o caminho a seguir.

Ponte medieval do Senhor da Ponte
Fica um pequeno alerta para os peregrinos que utilizem bicicleta, é preferível subir mais um pouco até Arrifana, pernoitando nas instalações dos Bombeiros Voluntários desta localidade, uma vez que para pernoitar no Quartel dos Bombeiros Voluntários de São João da Madeira, é necessário andar em sentido inverso cerca de 5km.

Espigueiro e ponte medieval do Salgueiro
O dia ainda não tinha acabado, depois de instalados e tomado o tão ansiado duche, foi necessário pedalar mais 2km, até encontrar um estabelecimento para repasto.

De regresso ao quartel, onde também pernoitava um jovem casal de peregrinos espanhóis, foi difícil adormecer, primeiro devido ao barulho proveniente do bar contíguo ao pavilhão, depois com um extraordinário concerto de música "ronqueira" protagonizado por um exímio executante na arte de ressonar. A prestação foi tão competente que me deixou sem dormir, tal como ao Joaquim Tavares, uma boa parte da noite. Penso que até nem deixou indiferentes os peregrinos espanhóis ali presentes.

Fotos da 1.ª Jornada

31 de Julho, 2.ª jornada, São João da Madeira - São Pedro de Rates, 90 km.

Igreja de Santa Isabel - Arrifana
Após o pequeno almoço no bar do quartel, começámos a pedalar pelo fresco da manhã, Eram 7:55, quando partimos e logo com uma subida de 3 km em direcção ao centro de São João da Madeira. 

Continuámos a subir até ao alto da Arrifana e estava feito o aquecimento para enfrentar a segunda maior jornada do Caminho.

Curiosamente, Arrifana e Coimbra têm a particularidade de ter a mesma padroeira, Isabel de Portugal, a Rainha Santa. A Rainha Santa Isabel, que viveu grande em Coimbra grande parte da sua vida, foi muito devota a Santiago. Desde Coimbra peregrinou até Compostela por duas vezes, confirmadas. Havendo quem defenda que o teria feito, de forma anónima, por mais duas ocasiões.

Peregrino à passagem por Arrifana
Pouco depois da Arrifana, passava das 09:45, cruzámos-nos com mais um peregrino, contudo somente a partir do Porto e principalmente de São Pedro de Rates é que se tornou mais constante o encontro com os demais peregrinos.

Na Malaposta o Caminho derivou para a antiga calçada romana, depois Estrada Real, prosseguindo pelo lugar de Souto Redondo até Lourosa.

Infelizmente esta via histórica não se encontra devidamente preservada, é deprimente o estado em que se encontra a calçada, envolta por vegetação selvagem e depósito de lixos indesejáveis.

Prosseguindo, em Grijó ladeámos o Mosteiro e um frondoso bosque de carvalhos cercado por extensos muros antigos, feitos de pedra.

Grijó
A necessidade de reabastecimento obrigou a nova paragem num café à entrada da vila, onde também estava um casal de peregrinos com duas crianças de tenra idade, que transportavam em carrinhos de bebé.

Ficou com algum desgosto que não visitámos o Mosteiro de Grijó, ficando a referida visita agendada para outra ocasião.

Depois de Perosinho subimos a difícil calçada da Serra de Negrelos, contudo a passagem pelo bosque foi reconfortante, o fresco da vegetação transformava mais leve o pedalar, parecendo aumentar a sua cadência.

Calçada na Serra dos Negrelos
A chegada a Vila Nova de Gaia não foi demorada, contudo o acelerar do ritmo necessitava de uma recompensa alimentar. Assim nada melhor que uma pequena sondagem para obter indicação de onde comer bem, pelo mais baixo preço.

O local escolhido foi o Piri-Piri, onde o cheirinho a frango assado dissipou qualquer dúvida quanto à ementa a escolher.

Serra dos Negrelos
Após o repasto, seguimos para a zona ribeirinha de Gaia, para o indispensável café. Gaia superabundava de turistas nesta altura do ano.

Ao subir da Ribeira para a Sé do Porto, o encontro com duas peregrinas alemãs que se preparavam para iniciar o Caminho, de bicicleta, a partir do Porto propiciou alguns momentos de conversa. As jovens não dispunham de qualquer informação sobre albergues e lugares do Caminho, assim, oferecemos-lhes um guia, que por certo muita utilidade lhes daria, face à completa ausência de informação que dispunham, a não as setas amarelas do Caminho.

Porto, Ribeira
Subindo à Sé do Porto para a aposição dos carimbos nas credenciais, apenas no detivemos o tempo necessário para o efeito.

Urgia sair do Porto, uma vez que ainda faltavam uns bons cinquenta quilómetros até São Pedro de Rates.

Ao passar na Maia o primeiro contratempo na bicicleta do Aguiar, com problema na pedaleira, o que originou um desvio na procura de alguém que lhe pudesse valer, o que veio a acontecer.

Numa primeira fase ainda o seguimos, mas de pouco adiantava e assim enveredámos novamente pelo Caminho.

A partir de Vilarinho, a paisagem muda radicalmente, o Caminho começa a penetrar por campos agrícolas verdejantes, e à medida que se avança para Nordeste, os vinhedos marcam a tradicional paisagem minhota.

Na passagem do Ave, a ponte dos Arcos, as sombras espelhadas no rio, a velha azenha, enfim toda a zona envolvente, são motivos que apraz registar e lembrar. 

Ponte dos Arcos
Finalmente, e após 90 km a pedalar e de frequentes paragens para a captação de imagens, eis-nos em São Pedro de Rates. No momento em que seguia com o Joaquim Tavares em direcção ao albergue, encontrámos de novo o Aguiar, em velocidade apressada, com bicicleta reparada e pronto para novo empeno!!!

O edifício do albergue de paredes antigas e austeras encontra-se bem cuidado e conservado, o pátio interior, bem ajardinado, é muito agradável e convida ao repouso. Nele se insere um telheiro aproveitado como espaço de exposições sobre o Caminho.

Depois de um duche bem merecido, rumei ao pequeno mini mercado próximo do albergue, onde, com apenas sete euros e alguns cêntimos, comprei os ingredientes para fazer o jantar. 

Rio Ave
O menu foi esparguete com atum em tomate e cebola, acompanhado por sumo de cereais e para finalizar fruta da época. Para sobremesa bolo de frutos secos, oferta da Sandra, numa palavra, perfeito.

Mas o pior ainda estava para acontecer. A segunda noite foi nova tormenta, repetiu,-se, desta vez com colunas de som, o concerto musical do primeiro dia. A novidade foi a musica tradicional galaico-portuguesa, onde intrusas concertinas ronqueiras deliciaram os ouvidos do pobre Joaquim. Nem mesmo usando a habitual mascarilha do Zorro conseguiu vencer as gralhas nocturnas. 

Ponte em São Pedro de Rates
A resignação foi total, tanto mais que o maestro do grupo, nessa noite, usou uma camisola de meia manga, com seta amarela.O espírito do Caminho intensificava-se, à medida que se avança no Caminho. São Pedro de Rates, para além do simbolismo histórico que representa, vive de forma entusiástica e hospitaleira a senda do Caminho.

É justo uma palavra de agradecimento para os hospitaleiros do albergue, gente boa, bastante simpáticos e prestáveis. É nobre a sua atenção para com os peregrinos.

No 2.º dia do iniciámos o Caminho às 07:55, percorrendo os 90 km, até São Pedro de Rates, onde chegámos pelas 20:15.
01 de Agosto, 3.º dia, de São Pedro de Rates a Rubiães, 77,70 km.

Igreja Românica de São Pedro de Rates
Primeiro dia de Agosto e terceiro do nosso Caminho, fomos dos últimos peregrinos a acordar e a sair do albergue de Rates.

O plano traçado para a jornada impunha que fossemos dormir a Rubiães, o que equivale a dizer que forçosamente teríamos que passar a mítica e difícil Serra da Labruja. 

Os primeiros raios de sol começaram timidamente a querer surgir de um céu acinzentado. Após a preparação das bicicletas, dirigimo-nos ao único café aberto nas cercanias, muito próximo da velha e magnífica igreja românica.

Pelas 08:30, após o o pequeno almoço, recreámo-nos a tirar fotografias à igreja românica de São Pedro de Rates, uma das jóias da arquitectura religiosa medieval portuguesa.

O lendário Galo de Barcelos
Os primeiros quilómetros foram de reencontro com os peregrinos que na véspera conhecêramos no albergue de Rates e muitos outros que pelo Caminho fomos encontrando.

Uma pequena história ressalta ainda do dia anterior, trata-se da jovem hospedeira que simpaticamente nos acolheu no albergue. Assim, contou-nos que ao fim de algum tempo a acolher e assistir peregrinos, ela mesmo iria iniciar o seu Caminho, a partir de Rates. A ansiedade quase não a deixou dormir e foi das primeiras a partir. Após alguns anos de trabalho voluntário, finalmente resolveu fazer o seu próprio Caminho, partilhar as suas vivências.

A aproximação de Barcelinhos e logo a seguir Barcelos, originou nova paragem. O Joaquim Tavares e o José Botelho demoraram um pouco com a fotografia. Depois de passar a ponte a pose ao lado do famoso Galo de Barcelos e a oportunidade para comer uma saborosa bola de Berlim e beber um café com leite.

O Minho em Agosto fervilha de gente, as ruas de Barcelos estavam plenas de turistas, emigrantes e peregrinos.

Barcelos, Igreja do Bom Jesus da Cruz
Dos inúmeros motivos de interesse da cidade de Barcelos, destaco o templo do Bom Jesus da Cruz, que assinala o aparecimento miraculoso de uma cruz de terra negra no chão barrento da feira, em 20 de Dezembro de 1504, templo que abriu ao culto em 1710. Trata-se de uma edificação de cúpula e planta centrada, com o espaço interior disposto grega, da autoria do Arquitecto João Antunes.

Um pouco absorto com o templo do Bom Jesus da Cruz, que não canso de admirar, novo desencontro aconteceu, desta vez fiquei para trás. Pensando estar na frente fui rolando devagar, sem pressa, esperando o reagrupamento.

Peregrinos a Santiago
Como a demora era muita obtive a informação de um peregrino que regressava de Santiago, a caminho de Fátima, que me informou da diferença de uns bons 15 a 20 minutos para os meus amigos.

Foi hora para dar corda aos sapatos e imprimir um ritmo mais forte, o tipo de percurso também ajudava. Finalmente o reencontro, no rio Neiva, junto à Ponte das Tábuas, momento aproveitado para uns mergulhos na água límpida e cristalina do rio.



Ponte das Tábuas
Aqui não poupámos tempo, bem pelo contrário, apetecia ficar para o resto do dia, não fosse o objectivo programado. Sem dúvida um bom momento.

Serpenteando por terrenos de cultivo do milho ao passar o cruzamento da N201 com a N308, resolvi fazer um pequeno desvio, parei num café para comprar uma bebida e reabastecer de água, tentei comprar fruta, mas sem sucesso uma vez que o minimercado estava encerrado, salvou-me a jovem do café, dispensando-me algumas laranjas e um BTTista de Silves a fazer o Caminho em companhia de um grupo de espanhóis, oriundos de Murcia, que simpaticamente me ofereceram fruta

Ponte de Lima
Com a dupla Joaquim/Aguiar uns 10 a 15 minutos à frente, entrei numa zona de bosque. A subida de algum relevo, era amenizada pela sombra. Mais à frente reagrupámos novamente para uma pequena refeição, em jeito de piquenique.

A aproximação a Ponte de Lima era desejada, aqui efectuámos uma paragem para refeição na Tasca das Fodinhas, onde o Cardápio da Márcia era bem sugestivo, como podeis ver na foto.

Serra da Labruja
Não podíamos relaxar muito, como diz o velho ditado, o rabo é o pior de esfolar, e ainda tinha-mos que esfolar a subida da Serra da Labruja!

Descer a Labruja também não é fácil, há sobretudo que ser cuidadoso, para não hipotecar o resto do Caminho.

Chegámos a Rubiães às 20:30, debaixo de um céu cinzento e ligeiros chuviscos, tendo pedalado nesta jornada 77,70 km.


A descer a Labruja
Com o albergue lotado, restou-nos dormir na sala de refeições. Do pouco tempo que dispúnhamos
ainda ouve lugar para entabular alguma conversa com o Vítor Matos de Coimbra e com a Olívia de Viana do Castelo e com alguns peregrinos espanhóis.

No entanto o duro final de jornada não podia terminar sem um merecido jantarinho no restaurante mais próximo do albergue, na companhia simpático pessoal de cozinha, do dono e do empregado de mesa.

Fotos do 3.º dia

2 de Agosto, 4.ª Jornada,  Rubiães - Pontevedra, 76 km.


Albergue, em Rubiães
Rubiães, 02 de Agosto de 2013. A noite foi atribulada, um peregrino de nacionalidade alemã passou mal, pelo que foi necessário chamar por socorro médico. Na altura não percebemos bem o que se estava a passar, pensei, inclusive, que seriam os primeiros peregrinos a sair do albergue. O Aguiar continuou sempre ferrado que nem uma pedra, não deu por nada. Finalmente uma noite sem que se tivesse dado  por ele. 



Pequeno almoço em Rubiães
Este dia iria ser diferente dos anteriores, saímos do albergue, pelas 07:56,  à medida que se progredia no Caminho, encontrávamos cada vez mais peregrinos. O pequeno almoço foi tomado em Rubiães, onde contámos com a simpatia  e boa disposição do proprietário.

Na véspera, apesar de termos chegado tarde ainda convivemos um pouco com alguns peregrinos espanhóis, fiquei também a saber pela Olívia, de Viana do Castelo, que as melhores Bolas de Berlim são as do Manel e não do Zé, estou a referir-me ao Natário, que tem as melhores Bolas de Berlim do Mundo.

Após o pequeno almoço aproveitei para trocar contactos com o Vítor Matos, de Coimbra, que fazia a peregrinação na companhia de um espanhol de Saragoça e de uma rapariga de Valência.

Peregrinos no Caminho
A jornada que marcou a entrada do Caminho Português por terras da Galiza,  foi caracterizada pelas frequentes paragens, ora para trocar dois dedos de prosa com os peregrinos, ora para as indispensáveis fotos, ou para reabastecimento.

Continuámos a cruzarmos-nos com os peregrinos que viajavam quer em grupos quer individualmente e a transmitir a habitual saudação de Bom Caminho. Pouco depois, já em São Bento da Porta Aberta, continuámos por terreno montanhoso, em direcção a Gontomil, altura em que parei para uma foto de conjunto com cerca de  40 a 50 peregrinos americanos, certamente ainda mais inspirados pelo filme The Way, com Martin Sheen no principal papel.

Valença do Minho
Depois do divertido encontro com o numeroso grupo de peregrinos americanos, com quem troquei a captação de imagens, foi a vez de reencontrar a Olívia de Viana do Castelo e as suas colegas de Valência, nova troca de contactos e depois de alguns dedos de conversa, lá voltámos a pedalar.

A entrada em Valença foi acompanhada por chuva ligeira, que entretanto desapareceu. Como os primeiros quilómetros foram lentos, tratámos de nos fornecer logo no primeiro supermercado, para uma refeição à base de sandes e fruta.

Subimos à Fortaleza, onde é sempre agradável a vista sobre o Minho bem como para o outro lado da fronteira. Depois de algumas fotos prosseguimos descendo da Fortaleza em direcção ao antigo posto fronteiriço.


Início do Caminho Português, em Tui
Enquanto atravessava a velha ponte, não resisti a tirar algumas fotos. Estava entusiasmado, tantas foram as vezes que por ali andei, sempre com o mesmo pensamento, tenho que fazer um dia o Caminho Português. 

Ponte de Veiga
Em boa verdade, tinha planeado fazê-lo em 2008, mas ainda bem que decidi nesse ano acompanhar o Joaquim Tavares e o José Botelho, naquele que foi um belo fim de semana alargado, e que já dei conta na Página acima indicada, com o título Finisterra, foi igualmente uma magnífica aventura, se assim se pode chamar. 

A entrada em Tui pelo Caminho Português tinha que ser assinalada, precisamente junto ao primeiro marco que encontrámos em território galego, lá tirámos a foto de conjunto.


Prosseguimos pelo vale do rio Minho até encontrar a Ponte da Veiga, antes desta ponte medieval virámos à esquerda, seguindo num passeio agradável por frondosos  bosques.


Ponte das Febres ou de São Telmo
Continuámos a seguir as as setas e detivemos-nos na histórica Ponte das Febres ou de São Telmo, onde é visível uma placa com os seguintes dizeres Aquí enfermó de muerte São Telmo, en abril de 1246. Pídele que hable con Dios en favor tuyo. São Telmo, bispo patrono de Tuy e de Frómista, faleceu neste local quando se dirigia em peregrinação a Compostela.

Seguimos pelos bosques até A Madalena, continuámos alcançando outra ponte medieval, a Puente de Orbenlle sobre o rio Louro. Atravessamos a ponte e iniciamos uma ligeira subida até chegar ao Polígono Industrial das Gándaras.

Puente de Orbenlle
As sucessivas paragens que o Caminho impõe, traduzem-se numa velocidade média mais baixa, assim, nalgumas ocasiões temos que compensar o tempo gasto, para não desvirtuar o plano traçado.
A travessia do Polígono Industrial do Porriño foi efectuada debaixo de um sol forte, e com a maior velocidade que as pernas permitiam, dado tratar-se de uma zona pouco agradável, muito exposta e movimentada, sem dúvida o ponto negro do Caminho Português, na Galiza, finalmente, depois de um esticão mais forte, para passar o quanto antes a zona industrial, chegámos a Porriño.
Porriño
Prosseguimos pela estrada que liga Porriño a Redondela, abandonando-a um pouco à frente, na direcção de Amieiro Longo.
Apesar de o dia ter começado cinzento e até com alguma chuva em Valença, a tarde estava com um sol forte. Assim, em Mos, parámos para beber uma bebida refrescante junto ao Palácio e à igreja barroca de Santa Eulalia.

"Rua do Cabaleiros - Mos"



A acompanhar as bebidas, foram-nos gentilmente oferecidas umas porções de empanada Galega. Posso dizer que vieram mesmo a calhar, o corpo precisava de algum combustível para iniciar, desde Mos a subida de um dos lugares mais simbólicos do Caminho Português, a ingreme subida da Rúa dos Cabaleiros.


Chan de Pipas, pela via Romana


Após a difícil subida até ao alto do Inxertado, aqui penso termos recebido a justa recompensa, pela dupla e agradável paisagem verde, dos bosques e dos terrenos sempre muito bem cultivados. 

A Galiza faz bem ao corpo e à alma, a agradável sensação de percorrer terras galegas é indescritível, mas seguramente absorvida por todos quantos trilham estes caminhos.  

O Caminho segue a Via Romana, assinalada pelo miliário de Vilar de Infesta, atravessando a meseta de Chan das Pipas.

Ria de Vigo e a ilha de San Simón
Após a planura de Chan de Pipas, descemos pelo Caminho que envereda pela N550. e depressa chegámos a Redondela, numa altura em que começou a rarear o encontro com os demais peregrinos, a esta hora, muitos já se encontrariam instalados nos albergues. Mas não podíamos pensar ainda em encostar as bicicletas, para nós a jornada teria que terminar em Pontevedra.

Em Redondela efectuámos uma paragem junto ao albergue, situado num edifício histórico do século XVI, conhecido como Casa da Torre, que se destaca pela sua arquitectura e pelo seu uso prático e cultural. 

Ponte medieval em Pontesampaio
Ao sair de Redondela comecei a acusar alguma fadiga, um pouco motivada pelo ritmo inconstante e a necessidade de uma refeição, ainda que ligeira, do que pelo acumular de quilómetros  realizados. 

Passada a ponte do caminho de ferro, segundo informações concelhias, da autoria de Eiffel, o Caminho sobe, rodeado por uma zona arborizada, atingido o cume, iniciámos a descida,  interrompida para observar e fotografar a Ría de Vigo e a ilha de San Simón.


Encontrámos de novo a N550, que percorremos, entrando em Arcade, capital das ostras na Galiza. Bem que nos apetecia forrar aqui o estômago, mas era importante chegar, ainda dia, a Pontevedra, assim decidimos que o melhor era mesmo tratar do assunto em Pontevedra, já com banho tomado.

Vrea Vella da Canicouba
Seguia o Aguiar na frente, secundado pelo Joaquim e ainda pensava na paella que ficou para trás, quando vejo um automóvel sair de uma curva que antecede a histórica Ponte Sampaio, a toda a velocidade e quase desgovernado. Não sei se foi Santiago, mas por pouco o enorme susto não tinha redundado em tragédia.

Velha calçada romana
Passada a histórica ponte sobre as águas do rio Verdugo, entrámos em Pontesampaio. Seguimos um dos troços mais bonitos do Caminho Português, na Galiza, a Vrea Vella da Canicouba, subimos o antigo caminho empedrado até à encruzilhada para Nuestra Señora de Amil, frequentado desde as épocas mais remotas e onde são visíveis marcas das rodas dos carros, sulcadas nas velhas lousas.

Continuámos em direcção a Pontevedra, descendo o Caminho, rodeados por pinheiros, até aos 
vales de Alcouce e Boullosa. A paisagem modifica-se à medida que progredimos, chegando finalmente ao albergue de Pontevedra.

Seguiram-se os afazeres normais até ficarmos instalados, e, após o duche, arriscámos sair do albergue para jantar no centro da cidade.
Pontevedra - Jantar
A partir daqui aconteceu um pouco de tudo, o jantar que coube melhor em sorte ao Joaquim e ao Aguiar, com um aperitivo de deliciosos mexilhões, chuva no regresso, albergue fechado, a termos que passar as bicicletas por cima do gradeamento, e, quando pensámos que o pior tinha passado, as portas do albergue estavam fechadas.

Contudo, a sorte acabou por nos sorrir. Duas jovens de Braga ouviram a minha chamada. Falo em  sorte porque uma delas reconheceu a minha voz, pois tinhamos estado a tagarelar antes da saída para o jantar.

Mas não foi tudo, pois antes de sair para jantar, deixei a carteira, máquina fotográfica e tudo mais, no pátio do albergue. No entanto um ciclista de Braga que também fazia o caminho, reparou casualmente no meu esquecimento e guardou os meus haveres. Bem haja.

Percorremos nesta jornada 76 km. chegámos a Pontevedra por volta das 20:00, um pouco exausto, a precisar de um duche, como de água para beber.

03 de Agosto de 2012, 5.º dia, de Pontevedra a Santiago de Compostela , 75 km.


Albergue de Pontevedra
Primeiro Sábado de Agosto,  acordámos para a derradeira jornada do Caminho, após cumpridas as exigências indispensáveis deixámos o albergue de Pontevedra, procurando local para tomar o pequeno-almoço. 

Igreja da Virgem Peregrina
Bem no centro da cidade, próximo da ria, encontrámos finalmente uma cafetaria onde os clientes eram maioritariamente peregrinos. Ao balcão, um "borracho" bebia uma cerveja, ao mesmo tempo que tirava do sério o proprietário do estabelecimento.

Pontevedra despertava timidamente, apenas nas proximidades do mercado municipal era visível alguma agitação matinal. Alguns "borrachos" ainda deambulavam pelas ruas. Mas o destaque ia, sem dúvida, para a quantidade de peregrinos, de todas as idades e nacionalidades, que faziam o Caminho Português.
Os primeiros quilómetros, após Pontevedra, sempre na companhia de muitos peregrinos, no Caminho ninguém está só, mesmo os que, por qualquer motivo, pretendam percorrê-lo nessa condição.
Continuámos na companhia de muitos peregrinos, junto à igreja de Santa Maria de Alba estive à conversa com peregrinos provenientes de Cádis, ainda perguntei se conheciam Camilo, um amigo que fez comigo o Caminho Francês em 2007, embora as probabilidades fossem muito poucas.
A beleza do percurso estampa-se nas imagens que apresento, mas é difícil descrever o sentimento que interiorizamos.
A aproximação a Santiago é um estado antagónico, por um lado queremos chegar depressa, por outro apetece continuar no Caminho.
A imagem que se repete todos os anos na Praça do Obradoiro, por muito idêntica que possa parecer, encontra sempre particularidades diferentes, o sentimento é sempre novo.
Finalmente a chegada a Santiago de Compostela, pelas 16:16, estava feito o meu Caminho Português,  a via mais percorrida, entre Coimbra a Santiago estava por fim concluída. Agora, sempre que passe em Tui não preciso de me lamentar de ainda não ter feito o Caminho Português, como acontecia anteriormente.
Após a conclusão do Caminho Português de Santiago, em 2012 pelo interior, e agora o Caminho Central, a vontade e a determinação de continuar a pedalar em direcção a Compostela mantém-se, quiçá ainda mais acesa. O sonho de repetir o Caminho Francês está latente, assim existam condições para o tornar uma realidade. Porém, enquanto tal não acontece, há que pensar em fazer outros Caminhos mais acessíveis...

Fotos do 5.º dia